Conheça a província chinesa de Shanxi

Conheça a província chinesa de Shanxi

Localizada no norte da China, a província de Shanxi (山西), cujo nome significa “a oeste das montanhas” – referência à sua posição em relação à cordilheira Taihang –, é um dos berços mais antigos da civilização chinesa. Ao contrário da vizinha Shaanxi (com grafia semelhante, mas pronúncia distinta), Shanxi costuma passar despercebida por turistas estrangeiros, embora concentre alguns dos mais bem preservados tesouros arquitetônicos, templos milenares e cidades históricas do país.

Com uma área de aproximadamente 156 mil km² e população estimada em 34 milhões de habitantes, Shanxi foi, durante séculos, um eixo vital para o desenvolvimento político e econômico da China imperial. Sua localização estratégica, entre o planalto de Loess e as planícies centrais, favoreceu o florescimento de antigas dinastias e o estabelecimento de rotas comerciais importantes, como a Rota da Seda secundária, que atravessava o interior do país.

 Riqueza em carvão e herança imperial

A província também é conhecida por suas vastas reservas de carvão, que lhe valeram o apelido de "coração energético da China". Desde o século XX, Shanxi tem sido uma das principais fornecedoras de combustível fóssil do país, responsável por boa parte da energia que alimenta as grandes cidades da costa leste, como Pequim e Tianjin.

Esse protagonismo industrial, no entanto, convive com um legado cultural que remonta a mais de 3.000 anos. Shanxi foi o centro de poder de vários Estados durante o período das Primaveras e Outonos (770–476 a.C.) e dos Reinos Combatentes (475–221 a.C.). Escavações arqueológicas revelaram artefatos de bronze, sepulturas elaboradas e inscrições em ossos oraculares que comprovam a antiguidade de suas civilizações.

 Pingyao: um museu a céu aberto

Um dos pontos mais notáveis da província é a cidade murada de Pingyao, declarada Patrimônio Mundial da UNESCO em 1997. Fundada durante a dinastia Zhou (cerca de 1.000 a.C.), Pingyao preserva grande parte de seu traçado urbano da dinastia Ming (1368–1644), incluindo muralhas imponentes, templos taoistas, casas residenciais de estilo tradicional e bancos centenários. A cidade foi um centro financeiro durante a era imperial tardia, lar do primeiro banco de letras de câmbio da China, o Rishengchang, fundado em 1823.

Turistas podem caminhar ao longo dos 6 km de muralhas intactas que cercam a cidade antiga, visitar o antigo yamen (sede do governo local) e explorar vielas estreitas onde o tempo parece ter parado. À noite, lanternas vermelhas iluminam as construções de madeira e pedra, criando uma atmosfera que remete aos romances históricos chineses.

 Templos entre penhascos e florestas

Outro tesouro arquitetônico é o Templo Suspenso de Xuankong, situado perto da cidade de Datong. Construído no século VI, o templo se equilibra precariamente em um penhasco de mais de 70 metros de altura, sustentado por vigas de madeira encaixadas diretamente na rocha. É uma das raras estruturas religiosas na China que combina elementos do budismo, taoismo e confucionismo.

Não longe dali, também em Datong, encontram-se as Grutas de Yungang, um dos maiores complexos de arte budista do mundo. Esculpidas durante a dinastia Wei do Norte (386–534), as grutas abrigam mais de 50 mil estátuas de Buda, algumas com até 17 metros de altura, esculpidas em cavernas de arenito. O local foi inscrito na lista da UNESCO em 2001 e recebe centenas de milhares de visitantes anualmente, especialmente após reformas que melhoraram a acessibilidade e a preservação das esculturas.

 Montanhas sagradas e turismo religioso

Shanxi também é lar do Monte Wutai, uma das quatro montanhas sagradas do budismo chinês. Localizado no nordeste da província, o monte abriga dezenas de mosteiros, entre eles o Templo de Xiantong e o Templo de Tayuan, com sua icônica pagoda branca. Monjes e devotos percorrem trilhas montanhosas em busca de iluminação espiritual, enquanto turistas desfrutam da paisagem alpina, que permanece coberta de neve boa parte do ano.

A área é considerada o lar do bodhisattva Manjushri, símbolo da sabedoria, e atrai tanto peregrinos chineses quanto estudiosos estrangeiros da arquitetura religiosa. Em 2009, o complexo monástico foi incluído na lista do Patrimônio Mundial, reforçando seu status como centro espiritual e cultural.

Economia tradicional e patrimônio imaterial

Além da mineração, a economia local ainda mantém vínculos com tradições seculares. Artesãos de Shanxi são conhecidos por sua habilidade em escultura em madeira, trabalho em laca, pintura folclórica e tecelagem de seda. A ópera Jin, uma variante regional do teatro chinês, sobrevive em vilarejos e festivais, com suas entonações únicas e trajes elaborados.

A culinária da província também reflete sua herança cultural. Shanxi é famosa por seus macarrões feitos à mão, em especial o daoxiaomian, preparado com tiras cortadas diretamente de um bloco de massa com uma faca. O vinagre de Shanxi, escuro e encorpado, é outro símbolo local, produzido de forma artesanal há mais de mil anos e usado como tempero essencial em pratos da região.

Entre a tradição e a modernidade

Em meio a esse cenário histórico, cidades como Taiyuan, capital da província, vêm se modernizando. A metrópole de quase 5 milhões de habitantes busca equilibrar sua vocação industrial com o turismo cultural e a proteção ambiental. Nos últimos anos, o governo local investiu em requalificação urbana, recuperação de monumentos e controle da poluição atmosférica – um desafio constante em regiões carboníferas.

A construção de museus, centros de convenções e a ampliação da malha ferroviária de alta velocidade facilitaram o acesso a Shanxi a partir de cidades como Pequim (a cerca de 500 km) e Xi’an. O turismo doméstico é crescente, impulsionado por campanhas que destacam a herança histórica e religiosa da província.

Resquícios da China imperial

Apesar de sua importância histórica, Shanxi continua à margem do circuito turístico tradicional da China, que privilegia metrópoles como Pequim, Xangai e Hong Kong. Contudo, o isolamento relativo contribuiu para preservar construções que desapareceram em outras regiões do país durante as guerras e revoluções do século XX.

Para especialistas como o sinólogo britânico David Leffman, autor de guias sobre o interior da China, Shanxi é uma “janela viva para a China imperial”, onde ainda é possível ver, tocar e sentir a arquitetura, os costumes e a religiosidade que moldaram a civilização chinesa ao longo dos séculos.

Mais do que um relicário de pedra e madeira, Shanxi representa a continuidade de uma identidade cultural profundamente enraizada, onde templos coexistem com minas, e tradições milenares resistem à velocidade do progresso. Em cada canto, muralha ou escultura, a província parece sussurrar ao visitante: aqui, a história ainda respira.

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